Conferência defende luta popular pela democracia, pela saúde e pelo SUS

 

Com o tema “Democracia e Saúde”, foi realizada, entre os dias 12 e 15 de abril, a 8ª Conferência Municipal de Saúde de Porto Alegre. Dezenas de delegados participaram do evento, ocorrido no Salão de Atos da UFRGS, debatendo propostas que visam a fortalecer o Sistema Único de Saúde frente ao atual cenário de ataque, em âmbito nacional e local, aos serviços públicos e às conquistas resultantes do processo de redemocratização e da Constituição de 1988.

 

O Simpa, como entidade participante do Conselho Municipal de Saúde e apoiadora da Conferência, esteve presente. Em atitude de repúdio à política privatista e ao descaso da gestão Marchezan para com os equipamentos públicos e seus servidores, representantes do Sindicato e da categoria exibiram faixa contra a privatização do SUS e contra o prefeito em diversos momentos do evento.

 

A Conferência reafirmou o compromisso do controle social com a saúde pública e universal e demonstrou a necessidade de buscar ampliar o diálogo com a população em defesa do SUS, ao mesmo tempo em que aprovou propostas aos governos de fortalecimento da saúde pública. Também explicitou, por outro lado, o desprezo da gestão Marchezan, que sequer enviou representante para a mesa de abertura e que tentou boicotar a realização da Conferência.

 

Entre as propostas aprovadas ao término da Conferência estão: defender a reforma tributária com direcionamento de recursos para a seguridade social; garantir o financiamento público com prioridade para a execução de serviços prestados diretamente pelo poder público; revogar a Emenda Constitucional nº 95/2016, que congela o gasto primário da União em saúde por 20 anos; extinguir a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que retira 30% do Orçamento da Seguridade Social para o Tesouro Nacional; realizar auditoria da dívida pública e investir na promoção e prevenção em saúde.

O encerramento, no domingo, foi marcado por caminhada que saiu do Salão de Atos da UFRGS por volta do meio-dia e se dirigiu ao HPS – que corre o risco de ser privatizado conforme já sinalizou a prefeitura – onde aconteceu esquete teatral do grupo Levanta Favela.

 

Balanço do CMS

 

No ato de abertura da 8ª Conferência Municipal de Saúde, na noite do dia 12/04, a coordenadora do Conselho Municipal de Saúde, Maria Letícia Garcia, falou sobre a história do SUS, os avanços obtidos pela mobilização popular e dos movimentos sociais e os retrocessos dos últimos anos. Ela também fez um balanço das ações e das dificuldades enfrentadas pelo CMS na administração Marchezan.

 

Letícia destacou a importância da fiscalização do CMS na gestão dos recursos da saúde em Porto Alegre, lembrando de casos em que ficou comprovada a malversação do erário público, como o caso Sollus, em 2010, quando foram desviados cerca de R$ 9 milhões.

 

A coordenadora também destacou avaliação feita pelo CMS sobre serviços de análises clínicas prestados por laboratórios. “Identificamos indícios de uma série de irregularidades e inconsistências que foram encaminhadas ao TCE e TCU, que verificou a utilização de recursos da ordem de R$ 43 milhões sem comprovação”. Além disso, disse, “em 2018, tivemos conhecimento de estudo econômico que aponta a possibilidade de economizar quase R$ 7 milhões ao mês com a maior utilização da rede pública de laboratórios ao invés da privada, como ocorre hoje”.

 

Com relação à possibilidade de terceirização dos serviços dos pronto-atendimentos da Bom Jesus e da Lomba do Pinheiro, Maria Letícia declarou: “olhamos com muita apreensão tais iniciativas, pois as experiências acompanhadas pelo CMS foram danosas para a população e não foram vantajosas para o erário público. Podemos, inclusive, destacar a experiência de Canoas, em que a empresa Gamp foi responsável por desvios milionários, prejuízos que inevitavelmente foram assumidos pela municipalidade local e pelo SUS”.

 

Do mesmo modo, salientou, “já está sendo noticiada a possibilidade de terceirização do HPS, que é um dos maiores símbolos do atendimento à saúde da população. Gerações de porto-alegrenses e de gaúchos tiveram suas vidas salvas por equipes de profissionais do HPS. E quantos profissionais fizeram sua formação em suas salas?”. Publicamente, explicou, a gestão justifica a medida argumentando que “não há agilidade na utilização de recursos, o que emperra a máquina pública; a isso, respondemos com a proposta de profissionalização da administração e gestão do SUS e com a autonomia financeira e administrativa dos recursos do SUS”.

 

Aula-debate

Outro ponto alto da abertura do evento foi a aula-debate com Gastão Wagner de Souza Campos, doutor em Saúde Coletiva e professor da Unicamp, e Sandra Fagundes, psicóloga e ex-secretária de Saúde do governo Tarso Genro.

 

“As políticas públicas e a democracia, no Brasil, estão em risco”, disse Campos. O professor colocou que “o poder Executivo, a Presidência da República, com apoio de grande parte do Legislativo, vai desconstruir muita coisa. Só que quando a gente construiu o SUS, a gente não estava no governo. Era ditadura militar e os primeiros governos foram contra o SUS. Ou seja, temos de continuar lutando e brigando”.

 

Em sua avaliação, “para defender o SUS, é preciso defender a democracia. E democracia não é só votar, mas significa também a democratização do poder, das relações de gênero, de raça, na gestão, nas famílias, na liberdade de religião com Estado laico”.

 

Neste sentido, Campos defendeu um movimento contínuo de defesa do direito à saúde pública e do SUS dialogando com a população, junto às comunidades. “Uma parte do povo, dos trabalhadores, está magoada e desconfiada da efetividade das políticas públicas”, justificou.

 

Além disso, o professor colocou: “O SUS tem sido muito dependente do poder Executivo. O SUS tem de ter mais autonomia”. E citando desvios ocorridos com organizações sociais (OS) na gestão de equipamentos públicos de saúde em outros estados, pontuou: “A terceirização e a privatização não são necessárias e são prejudiciais, fragmentam o SUS e colocam a rentabilidade na frente das necessidades dos usuários”.

 

Em diálogo com Campos, Sandra Fagundes falou sobre a divisão que existe hoje na sociedade: “temos a categoria do extermínio no governo federal e em parte da sociedade”. E completou: “Muito do peso que temos hoje em resistir é também o peso do existir. E nestas conferências, estamos dizendo que existimos, a favela diz, a mulher diz, o negro diz, os indígenas dizem”.

 

Ela destacou que as políticas públicas “sempre estiveram em disputa”, mas antes havia alguma preocupação com a inclusão. Hoje, no entanto, “o jogo ficou mais duro, pesado e muito baseado no medo”. Como ferramenta de resistência e luta em defesa do país e dos serviços públicos, Sandra defendeu a alegria: “Temos de produzir alegria, que também é saúde. É a alegria de estarmos juntos, com toda a nossa diversidade e polifonia. Isso é democracia”.

 

Participaram da mesa de abertura os presidentes dos conselhos Nacional e Estadual de Saúde, Fernando Pigatto e Cláudio Augustin; Matheus Neves, coordenador da Coremu, representando a UFRGS; o vereador Marcelo Sgarbossa (PT) e o vice-coordenador do CMS, Gilmar Campos. A abertura do evento contou com apresentações dos grupos Poetas Vivos e Levanta Favela.

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